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sábado, 4 de junho de 2011

Teoria da Perda de uma chance

Leticia Martines Ribeiro de Oliveira




  A teoria da perda de uma chance ou perte d’une chance, originou-se nos tribunais franceses em meados de 1965.
  Trata-se da perda da oportunidade de alcançar determinado resultado ou evitar determinado prejuízo.A título de exemplo, a inegável perda do cliente pela inércia desidiosa advogado que não se aprofundou na analise da ação impedindo que a mesma fosse analisada pelo orgão jurisdicional competente; o médico que não diagnostica corretamente o paciente com doença grave, retardando um possível tratamento; o concursando que deixa de prestar a prova porque o sistema de transporte falhou, etc. Essa oportunidade não é exatamente de alcançar, mas sim de tentar alcançar, coexistindo assim dois elementos: o de certeza e o de incerteza.
  Para que se configure a responsabilidade civil fundada nessa teoria, a chance perdida reparável deverá caracterizar um prejuízo material ou imaterial resultante de um fato consumado, não hipotético.
  Vejamos algumas ementas sobre o assunto:


“Responsabilidade civil. Hospital. Responsabilidade objetiva, nos termos do artigo 14, caput, do CDC. Possibilidade de afastamento da condenação mediante prova de que “o defeito inexiste” (CDC, art. 14, § 3º, I), vale dizer, de que o serviço foi prestado adequadamente, num contexto fático envolvendo
obrigação de meio e não de resultado. Ônus probatório para elisão da responsabilidade pertencente ao fornecedor de serviços, consoante regra do § 3º, do artigo 14, do CDC. Precedente. Apelado que não se desincumbiu do ônus probatório capaz de eximi-lo integralmente do dever de reparação que lhe é imputado, permitindo reconhecer instantes de desatenção quanto à detecção do início da parada cardiorrespiratória sofrida pelo autor. Agravamento das lesões cerebrais sabidamente relacionado ao tempo de duração da parada cardíaca. Elementos constantes dos autos que não permitem afirmar que a negligência do agir contribuiu decisivamente para as seqüelas neurológicas do apelante. Tempo de inatividade que permite, todavia, a aplicação da teoria da perda de uma chance. Critério a ser empregado para a quantificação da compensação pela perda da oportunidade que não se confunde com a indenização cabível para as hipóteses em que a responsabilidade do dano é integralmente imputada ao réu. Danos materiais indevidos. Arbitramento de compensação por danos morais em razão do inegável sofrimento decorrente da potencialidade da perda da oportunidade, também limitado ao critério supramencionado. Recurso parcialmente provido”.

9116047-02.2003.8.26.0000 Apelação; Relator(a): Adilson de Andrade; Comarca: Vargem Grande do Sul; Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 26/04/2011; Data de registro: 28/04/2011; Outros números: 2909714700)

“RESPONSABILIDADE CIVIL PELA PERDA DE UMA CHANCE - Programa de televisão em que candidato faz jus a determinado prêmio em dinheiro, caso acerte as respostas sobre clube de futebol - Cláusula contratual que indica a bibliografia a ser usada para as perguntas e as respostas - Livro indicado como bibliografia que contém duas partes distintas, uma meramente ficcional e outra com dados reais sobre a história do clube - Pergunta formulada com base na parte ficcional do livro - Resposta exata dada pelo candidato, mas divergente da parte ficcional do livro - Cláusula contratual a ser interpretada de acordo com a causa do negócio jurídico e a boa-fé objetiva - Programa de televisão que não versava sobre um livro, mas sim sobre a história de um clube de futebol - Eliminação indevida do candidato, que perdeu a chance de continuar no certame e receber o prêmio final - Valor da chance perdida - Ação parcialmente procedente - Embargos infringentes rejeitados”.

(9131381-66.2009.8.26.0000 Embargos Infringentes; Relator(a): Natan Zelinschi de Arruda; Comarca: Osasco; Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 07/04/2011; Data de registro: 25/04/2011; Outros números: 99409332493150001)


“Prestação de serviços. Acesso à internet. "Speedy". Falhas na prestação do serviço. Solicitações de orçamentos não respondidas. Perda de uma chance. Indenização. Danos material e moral. Repetição de indébito.
Se, em virtude de falha na prestação do serviço de acesso à internet ("speedy"), a assinante não pôde encaminhar a possíveis clientes orçamentos solicitados durante o período de indisponibilidade do serviço, responde a concessionária pela frustração decorrente da perda de uma chance.
Dano material. Ausência. Simples orçamentos não necessariamente se converteriam em contratação e, portanto, não se constituíam direito líquido e certo, mas mera expectativa de direito, não gerando prejuízo material.
Dano moral. Perda de uma chance. Prejuízo imaterial "in re ipsa". A perda da chance de ter orçamentos escolhidos e, assim, obter lucro, provoca frustração que constitui abalo moral suscetível de reparação.
Indisponibilidade do serviço. Repetição de indébito. A assinante faz jus à restituição de parte do valor pago mensalmente pelo serviço, proporcionalmente ao período de indisponibilidade.
Recurso parcialmente provido”.



(9245976-15.2008.8.26.0000 Apelação; Relator(a): Cesar Lacerda; Comarca: Araçatuba; Órgão julgador: 28ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 01/03/2011; Data de registro: 15/03/2011; Outros números: 992080186792)

  Como salienta Savatier, em sua obra clássica escrita há varias décadas: “ Normalmente, o simples fato de as chances de dano terem sido aumentadas por ação ou omissão faz apenas possível, mas não certa, a ocorrência desse dano.Toda via tal fato pode ter contribuído, se outras circunstâncias levarem a pensar que, na ausência das chances, o dano não teria ocorrido. Além do mais, a relação de causalidade sendo certa entre o fato alegado e a chance de dano criada, a vítima poderá ser indenizada do valor dessa chance, caso esse valor seja apreciável em dinheiro” ( La Responsabilité, 2 ed., t. II, Paris, 1951, p. 8, nº 460).
  Ressalta-se que a apreciação dos Tribunais Pátrios sobre o tema, ainda se verifica de forma tímida. Mas o grande responsável por isso é a própria vítima que formula de forma inadequada sua pretensão, impetrando ação de indenização quando esta deveria buscar a indenização da perda da oportunidade de obter uma vantagem.
  Concluindo, as discussões sobre o tema supracitado não visa a reparação  do dano, mas sim da chance que foi perdida.

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